domingo, 10 de maio de 2009

Alguns poemas Curtos - José Chagas

Criação

Como costela de origem
o osso
do sonho cresce
e o dormir do homem
cria
a manhã do mundo
na ovulação de um sol
guardado
para confrontação
entre sexo e Deus

Desvirgina-se a bainha
do sonho

Nasce a aurora
derramando sangue
em lençóis de nuvens


Paisagem

O amarelo
gira
ou gera
seu ouro inundado
de sol

A ira da luz
circula
em redor do eixo
que move
a manhã
máquina de flor
a construir paisagens

O azul olha
só de longe
com seu poder de horizonte


Constatação

O silêncio é a verdade
que ninguém disse
a forma de ser das coisas
e a travessia única
que pode levar o homem a Deus

A verdade não é feita para a boca
e o ouvido não precisa escutá-la
para que o homem saiba
que é vã
a matéria de seu destino


Epitáfio

Cabemos todos numa caixa
como um objeto que apodrece
em sua preciosidade

Pagamos pelo enterro
do pó que somos
e escrevemos palavras sobre
o silêncio que fica
como se a morte fosse fazer a leitura
de um assunto
para sempre encerrado


Fonte

Uma água bebida
não seca
a fonte

Desce pela garganta
o sonho

A paz não engasga
ninguém


Saliva real

O sal
no experimento da língua
sabe o sabor
da vida

O sal tempera
a não deglutida
certeza do mundo

O sal pode ser
o salário
da morte


Mesa sem jantar

A fome não teme
a faca
e o garfo
na mesa vazia

O prato espera limpo
e paciente
a lavagem
do que não teve

Nenhuma boca
exprime o pão
de cada dia

José Chagas


Para adquirir o livro
email:deusanachagas@gmail.com

Um comentário:

Adrianna Coelho disse...


Nem acreditei quando encontrei o seu blog! Admiro a sua poesia e sempre leio e indico seus poemas aos meus amigos poetas.

Gosto de todos os poemas aqui. Criação e Fonte são lindíssimos!